Rui Car
14/04/2018 16h00 - Atualizado em 12/04/2018 14h33

Novo vírus na cultura da Cebola traz prejuízo para agricultores no Alto Vale

Alho, cebolinha e outras plantas podem ser infectadas

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A safra de cebola 2017/2018 foi de muitos desafios para os cebolicultores catarinenses em especial na região do Alto Vale. Entre os problemas enfrentados, esteve as condições climáticas desfavoráveis que fez com que a quantidade de cebolas ofertada no mercado fosse menor do que a esperada. Em consequência das grandes variações do clima que prejudicaram o desenvolvimento das lavouras, ocorreu também o aparecimento de um novo vírus que fez com que alguns agricultores perdessem quase a totalidade das lavouras.

 

O aparecimento da nova doença, foi diagnosticado por técnicos da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) estação experimental de Ituporanga. E com o auxilio de testes sorológicos e biológicos, realizados no Laboratório de Virologia e Biologia Molecular da Embrapa Hortaliças (DF), foram confirmadas as suspeitas da presença do vírus “Iris yellow spot vírus” em lavouras de cebola da Região. A confirmação foi possível graças a um antissoro produzido pela Embrapa durante o primeiro registro do vírus no País, há mais de duas décadas.

 

De acordo com o pesquisador Edivânio Rodrigues de Araújo, da Epagri de Itruporanga, foram enviadas amostras de cebola para análise, após observarem na safra 2017/2018 sintomas que se assemelhavam aos induzidos por uma espécie de Orthotospovirus, nunca antes relatada em lavouras de cebola da região. “O principal sintoma observado em campo foi a presença de manchas amareladas em formato de diamante, em folhas e na haste floral”, explica o técnico.

 

Após o diagnóstico, os pesquisadores confirmaram que se trata do “Iris yellow spot vírus”(IYSV), vírus causador da doença conhecida popularmente como “sapeca”, em virtude dos sintomas de queima das folhas que se inicia pelo ápice. “Embora a ocorrência do vírus não houvesse sido registrada ainda em campos de cebola da Região Sul, há uma ocorrência anterior no Brasil que data da década de 1990”, conta Mirtes Freitas Lima, virologista da Embrapa Hortaliças.

 

Vírus já atacou lavouras no Nordeste há 25 anos

A primeira detecção de IYSV no País, quase 25 anos atrás, também foi comprovada Unidade de Pesquisa da Embrapa. Mirtes comenta que, naquela época, devido à elevada incidência de sintomas nas plantas, foram relatadas perdas significativas na produção de bulbos e de sementes de cebola na Região Nordeste, em especial no Submédio do Vale do Rio São Francisco, situado nos estados da Bahia e de Pernambuco.

 

Aqui em Santa Catarina foi oficialmente constatada nos municípios de Aurora, Campos Novos, Ituporanga e Alfredo Wagner. “Mandamos amostras de plantas desses municípios, o que não quer dizer que não possa ter ocorrido em outros municípios também”, comenta o técnico da Epagri de Ituporanga.

 

O envio das amostras que possibilitou o diagnóstico rápido e correto da doença foi baseado na observação do agrônomo Edivânio Araújo, pesquisador da Estação Experimental da Epagri em Ituporanga (SC). Ele coletou amostras de plantas com sintomas que considerou semelhantes. O pesquisador, que iniciou sua carreira como bolsista da Embrapa Hortaliças, ressalta que o vírus não é transmitido pela semente, mas pelo inseto vetor tripes, conhecido como “piolho da cebola”, uma praga da cultura. “Em anos mais secos e com maiores infestações das plantas por tripes, os riscos de ocorrência da doença se elevam”, avalia.

 

A rápida confirmação da infecção por IYSV pela Embrapa foi importante para que os pesquisadores e técnicos da Epagri pudessem orientar os produtores sobre a adoção de práticas para o manejo da virose em campo. “Isso somente foi possível porque tínhamos armazenado na soroteca do Laboratório de Virologia e Biologia Molecular um antissoro produzido na época da primeira detecção do IYSV, o que propiciou a identificação do vírus de forma precisa em curto intervalo de tempo de 24 horas”, explica Mirtes.

 

“Muito provavelmente, a doença já devia estar presente na região, entretanto, em baixa incidência e, em razão de diversos fatores, entre os quais a elevação da população de tripes, houve aumento na incidência da doença e os danos ficaram mais evidentes”, analisa a pesquisadora Mirtes. Ela destaca que, além das manchas nas folhas, os sintomas de seca são observados inicialmente nas extremidades da folha e podem ser confundidos com deficiência nutricional (ou outro fator abiótico). Logo, a equipe da Epagri foi efetiva ao suspeitar da ocorrência da doença.

 

O que fazer?

A grande dificuldade no controle da doença causada por esse vírus está no fato de não existirem medidas curativas para o controle. Uma vez infectada, a planta permanece assim e pode servir de fonte de vírus para outras plantas, quando há a presença de populações de tripes. Alguns fatores dificultam o manejo da doença, como o grande número de espécies de plantas hospedeiras do vírus e do inseto em campo. Os tripes, por exemplo, são capazes de infestar e se multiplicar em várias espécies de plantas.

 

Sendo assim as medidas são basicamente preventivas. “Não existe nenhum produto que haja diretamente no vírus. Uma vez que ocorreu a virose não tem o que fazer. A recomendação é buscar o controle do trips que é o transmissor da doença”, explica Edivânio Rodrigues de Araújo, da Epagri de Itruporanga.

 

O técnico acrescenta que é recomendado evitar situações de estresse para planta. “No caso de falta de chuva buscar fazer a irrigação da lavoura, utilizar a cobertura de solo que isso auxilia na manutenção da umidade, fazer a rotação de culturas e o manejo correto do solo da adubação, da irrigação são as medidas preventivas uma vez que não tem nenhuma medida curativa pra doença”, reforça.

 

Diferenças entre as doenças

Para quem não tem o olhar apurado e não conhece os sintomas causados pelo IYSV, pode-se confundir os sintomas com a queima ocasionada pelo fungo causador da mancha-púrpura ou com a queima ocasionada pelo míldio. “No da mancha-púrpura, o centro das lesões fica escurecido, e no caso da incidência de míldio não há formação de lesões bem definidas, diferentemente das manchas causadas pelo IYSV, que podem ser esbranquiçadas ou terem centro amarelo-esverdeado”, comenta o pesquisador da Epagri de Ituporanga.

 

Mirtes Freitas Lima, virologista da Embrapa Hortaliças, complementa dizendo que os sintomas de seca causados pelo vírus nas plantas de cebola podem ser severos, semelhantes à passagem de um lança-chamas na lavoura. “A queima das folhas compromete diretamente a produção de bulbos nas áreas comerciais, resultando em perdas na produção”, ilustra a virologista.

 

Como sintomas da doença também surgem no pendão floral, que gera as sementes usadas em novos plantios, os campos de produção de sementes de cebola também estão sujeitos aos prejuízos causados por IYSV, devido à morte de flores em plantas doentes.

 

Alho, cebolinha e outras plantas podem ser infectadas

Registros sobre a doença também apontam prejuízos à cebola em áreas produtoras de países da Europa, Ásia, África, Oceania e Américas, causando perdas variáveis. De acordo com a pesquisadora Mirtes Lima, há relatos de infecção natural pelo IYSV em várias espécies de plantas, entre as quais: cebola, espécies do gênero Allium (alho, cebolinha, alho-poró, etc.), plantas ornamentais e plantas infestantes. Por isso, recomenda-se, além do manejo integrado de pragas para controle do inseto transmissor, também a eliminação de determinadas plantas daninhas que, por serem sensíveis à infecção, podem atuar como fonte de vírus ou ainda como abrigo para o inseto vetor.

 

Em Santa Catarina, a equipe da Epagri já planeja, a partir da próxima safra, realizar pesquisas para detectar o vírus e entender a disseminação da doença na região, bem como ações para promover a adoção de práticas de manejo que minimizem as perdas ocasionadas pela infecção causada pelo vírus.

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