Rui Car
03/06/2020 08h19

CPI dos respiradores ouve servidora e ex-secretários

Depoimentos de Marcia Pauli, Helton Zeferino e Douglas Borba apontaram para erros do início ao fim do processo

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A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa (Alesc) que apura a compra dos 200 respiradores da Veigamed ouviu mais três testemunhas nesta quarta-feira (2): a ex-chefe da Superintendência de Gestão Administrativa (SGA), Marcia Regina Geremias Pauli, e os ex-secretários Helton de Souza Zeferino (Saúde) e Douglas Borba (Casa Civil). A sessão durou mais de dez horas e entrou na madrugada. 

 

Marcia foi a primeira a depor. Apontou que a responsabilização pela compra não é competência da SGA e que as decisões ‘vinham de cima’. “A SGA executa processo de compra, ela não origina compra. Ela não define compra de equipamentos. A SGA não especifica qual equipamento comprar, que quantidade e qual fornecedor. Nós somos demandados. O protocolo de intenções veio de cima para baixo”, afirmou.

 

Segundo ela, durante as duas primeiras semanas de pandemia, havia trânsito livre de fornecedores dentro do prédio da Defesa Civil, em que atuava o Centro de Operações de Emergência em Saúde (Coes), criado para organizar o combate ao Coronavírus no Estado.

 

“O Coes foi um erro. Aquela estrutura montada daquele jeito constitui um erro gravíssimo. Isso nós falamos não foi uma, não foi duas, não foi três vezes”, acrescentou. Segundo ela, a criação da estrutura bagunçou os processos de trabalho e a Secretaria de Saúde foi bombardeada por propostas sem ter condições de responder à demanda. 

 

Marcia detalhou ainda a participação de Borba nas negociações. Segundo ela, foi o ex-chefe da Casa Civil que intermediou o contato entre ela e o representante da Veigamed. A servidora disse que o agora ex-secretário a todo tempo falava “como o governador” e que havia pressão quanto ao seguimento das suas demandas. 

 

A servidora também esclareceu a participação de um deputado estadual citado nas investigações. Ela diz que não lembra do nome do parlamentar e que não houve pressão dele, e sim uma busca por entendimento sobre um caso específico. Marcia diz que pode identificar o deputado quando receber seu celular, que está com a força-tarefa de investigação criminal.

 

Seu depoimento durou mais de três horas e meia. Por fim, disse que um sistema mais seguro dentro da Secretaria de Saúde poderia prevenir o problema. Segundo ela, são precárias as condições para tramitação de processos dentro da pasta, que facilitam a adulteração de documentos e assinaturas indevidas. 

 

Zeferino

 

O segundo a depor foi o ex-secretário de Saúde, Helton de Souza Zeferino. Ele reforçou a tese dita à força-tarefa de que não autorizou pagamento antecipado e que, não fosse isso, não estariam com processo de CPI aberto. 

 

Zeferino disse que quando o processo chegou a ele, não havia menção a pagamento antecipado. Assim, deu prosseguimento à compra: caso os respiradores não chegasssem, a empresa seria notificada, mas não haveria prejuízo ao erário público. 

 

“Não existe relação de pagamento antecipado porque isso nunca foi determinado. Não existe determinação de pagamento antecipado”, afirmou. “Nós temos um pagamento que foi baseado na certificação de uma nota que foi encaminhado para o setor financeiro da Secretaria de Estado da Saúde”, complementou.

 

O ex-secretário citou mais de uma vez a certificação da nota pela servidora Marcia Pauli. Além disso, afirmou que o processo tem equívocos do começo ao fim mas que foi ele quem negociou os valores. Segundo ele, o processo seguiu o rito, como se fosse um pagamento normal, com prazo de quitação de até 30 dias após o recebimento. 

 

“Quem em sã consciência faz um pagamento antecipado e nem pergunta: olha só, é para pagar mesmo? Ela [a Marcia] certificou. Nós temos uma fraude aqui”, acrescentou. O ex-secretário apontou que a responsabilização da fraude seria de seus subordinados. No caso, a fraude envolveria Marcia e o coordenador do Fundo Estadual de Saúde, José Florêncio da Rocha. 

 

Zeferino disse ainda que tomou conhecimento da fragilidade do processo e entrou em contato com a Procuradoria-Geral do Estado (PGE) em meados de abril – o pagamento foi realizado dia 2 daquele mês e a reportagem do The Intercept Brasil foi veiculado no dia 28. 

 

Segundo afirmou o ex-secretário à CPI, a recomendação da PGE foi por esperar o dia 30 de abril, prazo máximo para a Veigamed entregar a primeira remessa dos equipamentos. 

 

O relator da CPI, deputado Ivan Naatz (PL), questionou a demora e disse que o governo deu tempo para que o dinheiro fosse transferido para outras contas. Assim, a Justiça conseguiu bloquear apenas 30% do valor total. 

 

“Há um amadorismo sem precedentes. Totalmente frágil, temerário. A legislação tem que ser mais rigorosa para não permitir que isso se repita”, disse Valdir Cobalchini (MDB). 

 

Borba

O ex-chefe da Casa Civil, Douglas Borba, voltou a afirmar que não houve participação dele, nem do governador Carlos Moisés da Silva, na escolha da empresa Veigamed. Tampouco que participou do processo de compra ou que indicou representantes da empresa para a servidora Marcia. 

 

Questionado pelos deputados sobre o Projeto de Lei do governo que ingressou na Assembleia para prever pagamento adiantado, Borba afirmou que a discussão da matéria precede o pagamento à Veigamed e que a retirada se deve à mudança de pensamento do governo sobre a necessidade da aprovação. 

 

Borba sustenta a tese de que repassou à SGA tudo o que recebeu de propostas, sem filtros. Além disso, classificou a aquisição como “desastrada”, em que “ritos não foram obedecidos e etapas não foram superadas”.

 

“Se os órgãos de controle tivessem sido acionados nesta compra, certamente essa compra não teria se efetivado”, acrescentou. 

 

No depoimento, Borba disse ainda que o assunto não foi discutido com o governador e que só ficou sabendo do fato semanas após a realização do pagamento. Para ele, Zeferino deveria ter verificado o documento com mais atenção, assim como outros servidores da saúde. 

 

“Esse processo de compra da Veigamed foi um processo que infelizmente passou sem ter o conhecimento de ninguém do governo. Eu tive o conhecimento desta compra numa reunião em 22 de [de abril] numa reunião provocada pelo próprio secretário Helton para dizer o seguinte: ‘fizemos uma compra, houve um erro, pagamos adiantado, e agora estamos com o problema”, relatou. 

 

Borba finalizou o depoimento dizendo que não pode pagar por responsabilidades de terceiros. “Nós não podemos terceirizar responsabilidades. O responsável pelas licitações na Casa Civil [até mês passado] sou eu. Agora, o responsável pelas licitações da saúde, não sou eu”, disse.

 

A próxima reunião da comissão está prevista para quinta-feira (4), às 10 horas. 

 

Fonte: RCN

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