Rui Car
14/06/2021 11h04

Temos 500 vezes mais plástico no mar do que estrelas no céu

Instituída pela ONU, a Década do Oceano (2021-2030), quer chamar a atenção para os cuidados e mudanças de hábitos diante da poluição e ameaças à vida marinha

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Atividades humanas, como pesca, navegação e descarte de resíduo impactam diretamente os ecossistemas marinhos (Foto: Diorgenes Pandini)

Atividades humanas, como pesca, navegação e descarte de resíduo impactam diretamente os ecossistemas marinhos (Foto: Diorgenes Pandini)

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Leitor que já olhou para o céu, à noite, possivelmente se encantou com a luz da Via Láctea. Talvez surpreso com a infinidade de estrelas. Pois saiba que neste momento trilhões de partículas de plástico – 500 vezes mais que os luzeiros de nossa galáxia – estão flutuando pelos oceanos. Uma terrível ameaça à vida marinha, alerta relatório da Organizações das Nações Unidas (ONU) nesta que é considerada a Década do Oceano.

 

Também é preciso lembrar: 8 de junho foi considerado o Dia Mundial dos Oceanos. A data é celebrada desde 1992, e sempre com um tema diferente. Em 2021, o lema é “Os oceanos: vida e subsistência”. Já a escolha da Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas foi definida em 2017. A Década da ONU leva em conta o prazo final para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e a linha do tempo que cientistas identificaram como a última chance de evitar mudanças climáticas catastróficas.

 

– À medida que trabalhamos para acabar com a pandemia e reconstruir melhor, temos uma oportunidade única – e a responsabilidade – de corrigir a nossa relação com o mundo natural, incluindo os mares e oceanos do mundo – sugeriu Antonio Guterres, na página oficial do Dia Mundial dos Oceanos. 

 

Atividades humanas, como pesca, navegação e descarte de resíduo impactam diretamente os ecossistemas marinhos. Estudos apontam que a cada ano 8 milhões de toneladas de lixo plástico são lançadas nos oceanos. Um problema global, já que as correntes marinhas espalham o material. O Brasil é o quarto país do mundo em geração deste tipo de lixo. De acordo com informações do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), quase 84% da água que sai das nossas torneiras possui partículas desse material. 

 

Por isso o alerta dos especialistas: até 2050, é possível que exista mais plástico nos oceanos do que peixes. Para se ter uma ideia da gravidade, a poluição dos oceanos é um dos maiores desafios ambientais da atualidade e pode ter se intensificado com a pandemia. Só no Brasil, a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) registrou um aumento de quase 30% na coleta de materiais recicláveis durante esse período. Quase tudo no nosso dia a dia envolve plástico: escovas de dentes, sacos, embalagens de comida, garrafas, recipientes culinários.

 

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Garoto se diverte nas águas de uma das praias em Florianópolis (Foto: Diorgenes Pandini)

O problema é que, diferente de outros lixos, os plásticos não se decompõem. Plásticos maiores podem causar a morte de alguns animais por estrangulamento e danos ao sistema digestivo. Os resíduos plásticos também danificam a superfície de corais, deixando-os mais expostos a doenças. 

 

Tem ainda o microplástico, resultado da fragmentação do material ou já feitos em tamanho menor. Esses fragmentos derivam de produtos como sabonetes, esfoliantes, purpurinas sintéticas e creme dentais abrasivos, os quais podem ter poluentes como pesticidas, tintas e combustíveis, o que os torna ainda mais perigosos para o ambiente. A exposição e a ingestão de microplásticos pode desencadear problemas aos animais marinhos como disfunção alimentar, interrupção da reprodução e distúrbios metabólicos. 

 

Desafios do gerenciamento costeiro 

 

Assim como a mobilidade urbana, o gerenciamento de proteção costeira e o combate à erosão marinha tornam-se necessários para cidades litorâneas que pretendem ser inteligentes. É o caso de Florianópolis, que nos últimos dias assiste ondas engolindo muros e residências no bairro Morro das Pedras, no Sul da Ilha de Santa Catarina. Os técnicos alertam: construções na orla ajudam a agravar a erosão e a recuperação natural das praias é lenta, além de nem sempre voltar ao que era antes.

 

O enrocamento de pedras para conter danos à infraestrutura pública, como já ocorreu na Praia da Armação, e o engordamento artificial da faixa de areia para recuperar a balneabilidade da orla, como em Canasvieiras, no Norte da Ilha, podem não ter os resultados esperados. Ainda mais diante da previsão de climatologistas e oceanógrafos que fenômenos extremos irão se tornar mais comuns. As consequências do aquecimento do planeta são devastadoras, pois derretem geleiras e os polos, fazendo com que mais água corra para os oceanos.

 

O “derretimento” das calotas polares foi tão forte que alterou até o eixo do planeta. Ilhas desapareceram do mapa, e lugares como Fíji, no Oceano Pacífico, estão afundando. No Brasil a situação é grave, se considerarmos que as principais cidades estão no litoral, como a maioria das capitais. O oceanógrafo Felipe Pimenta considera ser preciso ligar o sinal de alerta, especialmente no que diz respeito à relação entre o homem e a natureza: 

 

– A pior influência antrópica é a ocupação desordenada da zona costeira. As regiões de dunas, que absorvem a energia das ondas, têm muitas construções. O maior planejamento do governo, junto à fiscalização do poder público, é sanar esse problema. São questões que envolvem geografia, oceanografia, engenharia, planejamento urbano. Temos que começar a planejar melhor nossas cidades – sugere.

 

Os rios procuram o mar

 

Mas como o plástico vai parar nos oceanos? Um estudo publicado na revista científica Science Advances mostrou que 80% dos resíduos são carregados por milhares de rios. Diferentemente do que se pensava, a maior parte desse lixo é transportada por pequenos mananciais que atravessam áreas urbanas muito povoadas. É o que acontece, por exemplo, em Santa Catarina. 

 

De acordo com a Agência Nacional de Águas (ANA) os rios que drenam o território estadual de Santa Catarina integram três grandes regiões hidrográficas: do Paraná, do Uruguai, do Atlântico Sul. O Sistema Hidrográfico Atlântico Sul consiste em um conjunto de várias bacias autônomas que vertem diretamente para o litoral. O sistema de drenagem da vertente é formado por um conjunto de 12 bacias que fluem para o leste e deságua no oceano. 

 

Este sistema abrange cerca de 36 mil quilômetros quadrados, ou seja, 38% da área do Estado, com destaque para o Rio Itajaí-Açu, a maior bacia considerada inteiramente catarinense, nascida cristalina em Rio do Campo, passando por mais de 50 municípios até alcançar a foz, já bastante transformada pelo lixo doméstico e industrial, na boca da barra de Itajaí.

 

A vertente inclui outras bacias consideradas principais pela importância como dos rios Cubatão (Norte), Itapocu, Tijucas, Biguaçu, Cubatão (Sul), Tubarão, Madre, D’Uma, Urussanga, Araranguá. O rio Mampituba também integra o complexo, porém, por fazer divisa com o Rio Grande do Sul é um rio considerado de domínio da União.

 

Para o coordenador do projeto Observando os Rios da Fundação SOS Mata Atlântica, Gustavo Veronesi, a situação de um rio é o espelho do comportamento da sociedade, e o processo de degradação de um corpo d’água, por lançamento de esgotos sem tratamento ou desmatamento das margens é rápido, mas, a recuperação pode demandar muitos anos. Divulgado em março, o último Retrato da Qualidade da Água nas Bacias Hidrográficas da Mata Atlântica, mostrou que a qualidade da água dos rios brasileiros é 73% regular. 

 

Índice parecido foi colhido pela Secretaria Executiva do Meio Ambiente, integrada à Secretaria do Desenvolvimento Sustentável (SDE) em parceria com a Agência Nacional de Águas. O conjunto de dados analisados na campanha de março de 2021 demonstra que a qualidade da água em 67,5% dos pontos da vertente litorânea não atendeu a um ou mais padrões estabelecidos. É o caso do rio Itapocu, em pontos de coleta de Jaraguá do Sul e Guaramirim e, do rio Putanga, que serve de divisa entre Massaranduba e Guaramirim. Os maiores desacordos encontrados são dos parâmetros coliformes termotolerantes (presente em 60% dos pontos dos rios da vertente atlântica) e turbidez. 

 

De acordo com os técnicos, o estudo, que tem a missão de balizar ações para o cuidado dos rios, apresentou piora na qualidade da água, se comparado com as demais análises apresentadas em 2019 e 2020. A Bacia do Rio Itajaí apresentou o maior dado negativo referente à campanha 01/2021, com aumento significativo do percentual de coliformes. E quando se trata da qualidade global das águas, 70% dos pontos foram classificados na condição razoável. As coletas referentes à campanha de março de 2021 ocorreram entre os dias 1º e 10 de março. Dos 40 pontos analisados, oito pontos apresentaram a classificação “Ruim”, 29 pontos “Razoável” e três pontos a classificação “Boa”.


POR: ÂNGELA BASTOS – DIÁRIO CATARINENSE / NSC TOTAL

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