— A senhora tem alguma coisa antiga para vender? — perguntou Geislon Rodrigues à proprietária do velho posto de combustíveis.
Era a segunda vez que o blumenauense de 38 anos visitava o lugar, a 320 quilômetros de casa, em Barracão, onde a BR-470 encontra o Rio Grande do Sul. Na primeira oportunidade, havia recebido uma resposta seca: não, não havia nada ali que pudesse interessá-lo. Insistente, desta vez encontrou recepção mais amistosa. Talvez no depósito houvesse algo, disse a mulher.
Ao entrar no cômodo empoeirado, de imediato avistou duas velhas bombas de gasolina e diesel. As primeiras de uma série de 34 que seriam adquiridas e revendidas pelo caçador de relíquias nos anos seguintes.
— Olha aqui, ó. Tô todo arrepiado! — ri, apontando o braço esquerdo, enquanto relembra o episódio ocorrido em 2017.
Geislon é publicitário, mas desde a infância interessa-se por antiguidades. Um velho rádio da família originou a paixão. Há 15 anos, depois de comprar um Fusca 66, começou a frequentar lojas de sucata. Em 2012, largou o emprego numa produtora de vídeo para caçar velharias em tempo integral, principalmente as relacionadas ao mundo dos motores. Automobília, como chamam os entendidos.
Na garagem e por quase todos os cômodos da casa dos pais dele, no bairro Fortaleza, em Blumenau, estão espalhadas bombas enferrujadas, uma cadeira de barbeiro, geladeiras, móveis, brinquedos, bicicletas e placas, muitas placas. As esmaltadas são a especialidade do garimpeiro automotivo. Esso, Shell, Texaco… E marcas que nem existem mais, como Energina.
Alguns objetos Geislon manda restaurar antes da revenda, a pedido do comprador. A maioria, no entanto, é repassada com as marcas do tempo. Valem mais assim.
Televisão
Em 2010, o canal a cabo History Channel lançou Caçadores de Relíquias, uma série em que antiquários viajam pelos Estados Unidos vasculhando porões e sótãos alheios. Efeito imediato: a concorrência de Geislon aumentou. Mesmo assim, as viagens por municípios do interior do Sul do Brasil ainda rendem boas histórias (e lucro).
— O cara tem que ser muito chato ou ruim para voltar com o carro vazio, ainda tem muita coisa boa escondida por aí — garante.
Além de postos, os alvos prioritários são borracharias, botecos antigos e sucatas. Parte do trabalho é convencer os donos a desfazer-se de artefatos guardados há décadas. E pechinchar com sangue frio, exatamente como na série de TV.
Num caso assim, Geislon manteve conversas por cinco anos com o dono de um conjunto de placas esmaltadas. Só conseguiu comprá-las depois que o homem faleceu e os filhos o procuraram. Pagou R$ 15 mil por cinco delas, valor que conseguiu de volta passando adiante duas das cinco peças. Das outras três virá o lucro.
Os clientes chegam pela rede de contatos e pela internet. São colecionadores, pessoas que querem decorar a casa ou a empresa. E também alugar peças para festas temáticas.
— A graça é não trabalhar pensando no dinheiro. Foi a primeira vez que fiz isso na vida. Se Deus me permitir, nunca mais volto a trabalhar com algo que não me dê o prazer que sinto hoje — comemora.
Isso não quer dizer que o caçador de relíquias durma sempre tranquilo. No caso das bombas de Barracão, por exemplo, foram necessários meses de telefonemas e emails até que a dona do posto aceitasse vendê-las. Quando o “sim” finalmente chegou, Geislon ficou três dias sem dormir até que pôde viajar para buscar as relíquias.
Estresse do qual ele nunca reclamou.